Paredes brancas evidenciam o óbvio. Vazio. Monocromo. Ausência
absoluta de cor. Para ser mais específico, ausência absoluta. E ponto. Assim
como a arte, a vida caracteriza-se por qualquer coisa que vá de encontro ao
lapso de uma tela em branco.
Fotografias antigas, de épocas gloriosas, de uma juventude abastada
que jamais voltará. Quadros espalhados, penduricalhos de decoração, artigos de
preenchimento superficial, para curar a dor da solidão que verte em plangência
interminável e irremediável.
Uma rachadura parece quebrar o ciclo de inexistência da pálida
estrutura. Um rio de extensão curta, embutido na imensidão do quarto. Águas de
um mundo repleto de devaneios, inalcançáveis ou não, águas turbulentas,
onde penso ser capaz de flutuar.
Fecho os olhos, imagino um leque de cores vibrantes, universos
inteiros rabiscados, litros de inspiração e criatividade. O difícil é abri-los
e não encontrar nada além do mesmo. Porém, pigmentos são como sonhos e dependem
de minhas pinceladas aleatórias.
Desperto.
Para minha surpresa, nada mais parece ser como antes. Tudo se tingiu
de negro. Não há mais paredes brancas. Sinto-me completamente cego. Como se
houvesse tido meus olhos furtados durante o sono.
Tento, em vão, rabiscar um futuro de alegria e contemplação.
Entretanto, não sou capaz de enxergar o que faço, não sei se escrevo certo, não
percebo a coerência dos fatos, se traço linhas tortas ou apenas garranchos
perdidos e angustiados.
Meu dia virou noite.
As cores se foram. Sinto falta da cândida parede e de suas infindas
possibilidades. Se ao menos pudesse ver. Se ao menos pudesse observar, mesmo
que por uma última vez, o horizonte distante dos meus anseios. Meu reflexo num
espelho qualquer, minha identidade.
A verdade é que me perdi na negritude de uma noite que não deveria ter
fim. Acordei sem querer acordar e não consigo pregar os olhos. Preciso dormir.
Preciso insistir, lutar contra a cegueira dessa tristeza ininterrupta.
Preciso descansar.