sexta-feira, 28 de junho de 2013

Últimos Tragos

( e Os Primeiros Passos da Revolução no País do Futebol)

Observo lentamente o cigarro virar cinza, queimando aos poucos, caindo pelas beiradas, amontoando restos de milhares de substancias tóxicas e suas bitucas cheias de baba, junto aos cinzeiros da casa. A ansiedade por mudanças me leva às ruas, e meus tragos, à exaustão. Cada nova passeata me traz a sensação de uma maratona completa.

É lindo ver o movimento sacudindo o país. Milhões de corações loucos e tão exaustos quanto o meu, empunhando cartazes, soando palavras de ordem, amando o momento mágico que será lembrado por todos os professores de história das próximas gerações. Isso é muito mais gratificante do que qualquer chute em gás lacrimogêneo ou avos de centavos derrubados.

Nossos filhos saberão, que seus pais fizeram alguma coisa. Assim como seus avós também fizeram. Saberão que saímos da inércia, daquela situação confortável, da bolha, saberão que fomos para as ruas, que acompanhamos as fanfarras, que nos dedicamos às mais variadas causas e por conseguinte, enfim, saberão que alcançamos nossos objetivos.

Estes sim poderão - oxalá - desfrutar um país um tanto mais interessante. Porque beleza é o que não falta por aqui. Porque amor é o que não falta por aqui. Porque tesão por ser brasileiro é o que não falta por aqui. Porque isso e porque aquilo. Estes sim, graças ao meu bom pai, compreenderão a essência desse vandalismo ao qual noticiam.

O país das bundas e do futebol mais vistoso do mundo, agora, pode também se orgulhar de uma juventude irrequieta, mesmo que da noite para o dia. É tempo de mudança, é tempo de olhar para a frente. É tempo de não desanimar, tempo de ir à luta. Tempo de rever conceitos e mudar antigos paradigmas. Também é tempo, e isso há muito tempo, de largar o cigarro.

Últimos tragos e fim às considerações.

O contexto pede mais ansiedade, diversas noites mal dormidas, lances e mais lances nas catracas, cartazes e urros e gritos. Porém, sem o isqueiro no bolso. A revolução é tamanha que causa certo espanto aos meus pulmões.

Sorte a minha ambos não terem aderido aos manifestos, não seria de se espantar vê-los com suas cartolinas rabiscadas defronte um punhado de câmeras, protestando "seja PRIMEIRO EM VOCÊ a mudança que TANTO DESEJA para o mundo".

Nada mais justo. 

terça-feira, 25 de junho de 2013

Poucas Palavras

Nem sempre tenho as palavras certas na ponta da língua. Desafio a mim mesmo, em determinados momentos, a tirar algumas, mesmo que poucas, do fundo desse abismo mental. Me agrada a ideia de jamais errar o alvo, dar tiros certeiros e não desperdiçar uma vírgula sequer.

Quando não existe nada a ser dito, o melhor é permanecer quieto. Sussurros contidos ao pé do ouvido, gritos calados em meio à multidão. Estou distante demais para me esforçar um tanto mais e enfim, dizer algo que simplesmente não valha a pena. É a questão do irrelevante. Para quem? Para quê? Não faz sentido.

O silêncio tem sido, dentre tantos outros, o melhor dos amigos...

sábado, 8 de junho de 2013

A Vida É Um Doce

a vida é um doce
e bate forte, e bate firme
e chacoalha

a vida é um doce
divide-se em quadradinhos
cada um no seu

a vida é um doce
e tudo o que parece ser, não é
e tudo o que é espera, não vem

a vida é um doce
que amarga a língua;

la dolce vita bem se aplica aqui.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Amor e Fúria

Ela fala da leveza dos meus versos, acho bonito. Discorre sobre uma inexistente proximidade com Bukowski, à qual surpreendentemente admiro. Repete, diz que acha bonito. Aparentemente gosta bastante do que digo e soa um tanto menos maléfica do que parece ser.

Meia luz. Apenas um abajur, para ser exato. Ela é um colírio para os olhos e não demanda qualquer esforço para ser percebida diante à semi-escuridão da madrugada em questão.

Observo seu corpo nu, esparramado delicadamente sobre a cama. Meus olhos penetram profundamente os seus. Lentamente, caminho em sua direção e não desvio o olhar por um segundo. Sei do pecado que seria fazê-lo.

Imóvel, ela aguarda e sucumbe à investida que não tarda. Amor e fúria. Desbravo sua carne e me delicio, sem pressa alguma.

Diante dos fatos, como que a alertar sobre um possível desfecho, ela acena com um misto de gemidos e sussurros, aos quais não procuro compreender. Finalmente satisfeito, recolho meu corpo ao seu lado. O silêncio sugere infindáveis conclusões.

De repente, um beijo.

E agora sou eu quem não se move. A paralisia me consome subitamente e não sinto sequer minha respiração. Paranóia? Não. Busco recobrar meus sentidos, em vão. Muito além dos sintomas tetraplégicos, nesse momento, sou mais que um simples cretino. Sou um qualquer cretino totalmente entorpecido.

Quando o beijo finda, seus lábios tem gosto de morte. Enfim, minha sorte fora lançada. Ela acende um cigarro e se acomoda na poltrona. Intercala cada trago com um breve sorriso, risada, de menina travessa.  Por Deus, como é bonita!

Estou a um passo da eternidade e por incrível que pareça, um desejo, absurdo e derradeiro: outro beijo, tão intenso e mórbido quanto o primeiro. 

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Plano de Fuga

Saída pela direita, pela esquerda. Certas vezes é necessário ter em mente um bom plano de fuga. Saída à francesa, literalmente. Um ruído em falsete, no terceiro degrau da velha escada de madeira. A hora é agora.

Como disse anteriormente, tal plano deve estar perfeitamente pronto para ser colocado em prática. Não há tempo para improvisos. Qualquer lapso de criatividade momentânea torna-se descartável, por completo.

Os segundos subsequentes são determinantes. É  como um filme em câmera lenta, onde cada passo requer muito cuidado. O processo é milimetricamente calculado e demanda muita precisão. Seja qual for o destino final, imprescindível é o afinco para com todas as etapas. Um deslize pode custar caro e, em certos casos, até a vida.

Os possíveis paradeiros são muitos. Variam de acordo com o contexto, se estiver no banheiro, escorra pelo ralo ou esprema-se para dentro de um frasco de shampoo; se estiver na cozinha, esconda-se num pote de biscoitos ou abaixo da pia. Nunca no forno, nunca no microondas, os motivos são mais que óbvios.

Caso o local seja o quarto, fuja, mas fuja também dos clichês. O armário soa ridículo. Não vá para de baixo da cama. Procure alternativas viáveis e se necessário, perca a classe. O disfarce de abajur é sempre uma ótima alternativa. Vista uma fronha, camufle-se junto aos demais travesseiros ou, em último caso, torça para a cama ter um belo gaveteiro. Do contrário, corra para o telhado,  para a sacada. Todo quarto possui ao menos uma janela.

Se não houver saída, entregue-se. Esqueça o que eu disse no segundo parágrafo, proponha um ménage à trois, use e abuse de sua imaginação. Voe alto, mas lembre-se, truco não é jogado à três e não ouse de maneira alguma dormir em meio ao casal. A sinfonia de roncos pode ser ensurdecedora.

Uma última coisa, verifique a altura da janela, caso tal vôo seja fruto de um arremesso.