sexta-feira, 25 de outubro de 2013

O Que Somos (...)

Somos o que somos,
Nada além daquilo que pensamos ser (!?)
Somos seres estranhos
Em múltiplas carcaças-corpos
Transeuntes, passantes
Somos habitantes
E não fazemos ideia do paralelo fantástico
Que reside dentro de nós mesmos;

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Jogo da Vida



Passado exatamente um ano, mesmo dia, mesmo horário e diante do mesmo adversário, estava novamente ele, na marca do pênalti; Tibério - ou Tibé - camisa número dez da equipe do São Roque, clube do bairro de mesmo nome e que, há pelo menos duas décadas, não levantava a taça do pequeno campeonato entre bairros do subúrbio carioca.

Em situação semelhante, para não dizer igual à que vivera durante a disputa final do certame na temporada passada, estava novamente ele; ele e a marca; ele e a bola; ele, as traves e o seu carrasco, Carlos, o terror da Vila Treze.

Nascido e criado em São Roque, Tibé defendia a equipe desde menino, tendo passado por todas as categorias possíveis até alcançar o time principal. Era um símbolo, um ídolo, um garoto querido e idolatrado pelas ruas de sua comunidade. Seu pai, Reginaldo, um ex-jogador de pouco sucesso, acostumou seu filho à rotina dos treinos, levando-o para acompanhá-lo nos campos desde muito cedo. O garoto não reclamava, adorava assistir aos treinos do pai, um zagueiro troncudo, brigador, mas de inteligência tática limitada e pouca técnica. Tinha a seu favor o fato de que era dono de uma pequena mercearia e, por ventura, era o único patrocinador da equipe à qual defendia. Não que fosse esse o principal motivo de sua escalação como titular, mas influenciava um tanto, pois, sem contar os frutos das orações, toda ajuda era bem aceita, mesmo que viesse do bolso de um de seus jogadores.

Não se sabe, ao certo, se Deus, do alto de sua existência, é fã ou não de futebol, mas para aqueles que praticam o esporte, a resposta reside na ponta da língua. Sim, claro! O difícil é saber com exatidão para qual equipe o Todo Poderoso devota sua torcida. Os mais fanáticos costumam dizer que, de alguns anos para cá, o grande velho pegou birra do São Roque, outros, tão fanáticos quanto, vão além, ao dizer que não é birra do magnífico e sim, intervenção do demo. Não somente para o azar do time. Segundo as más línguas, reza a lenda de que os jogadores da Vila Treze fizeram um tal pacto com o tinhoso, o que serviria de explicação para a longa hegemonia nos campos de várzea.

Na primeira oportunidade, Tibé escolheu o canto certo, correu tranquilamente para a bola e bateu firme. Carlos se esticou todo e pegou. O goleiro, em questão de centésimos de segundos, pareceu dobrar a altura. Inacreditável ter alcançado aquela cobrança tão certeira. Mas alcançou. E dentro dos mesmos centésimos, o menino passou de herói a vilão. O sonho findou naquele instante, terrível, comentado à exaustão nos botecos de São Roque. Alguns apelaram para a pouca experiência, outros afirmaram displicência. Tibé perdeu o pênalti. São Roque perdeu o título. Fim de papo.

E agora estava ele, definitivamente defronte ao mesmo cenário, como um replay passado um ano. Ele e a bola; ele e a marca; ele, as traves e o seu carrasco, Carlos, o Terror da Vila Treze. Olho fixo na redonda, silêncio na torcida são-roquense. Era nítida a sensação de repeteco. Vai perder de novo¿ Suspense. Vai pegar, vai pegar, bradavam os adversários. Tinham motivo para não pensar o contrário. Era Tibé novamente contra Carlos, passado exatamente um ano, mesmo dia, mesmo horário, e diante do mesmo adversário.

Ele foi, deslocou pouco a pouco os seus pés e então correu. Silêncio. Carlos compenetrado. Pé e bola. Chute. Silêncio. Ninguém se arriscaria a quebrar a concentração, fosse de um, fosse de outro. Bola e ar. Curva. Jogada de efeito. Silêncio. Carlos decolou, voou, se esticou sem defeito e, contrariando o dito popular e sua vocação para endiabrado, se fez divino. Bola no canto, firme e, novamente, em suas mãos. Jogo da vida e a equipe da Vila Treze, campeã pelo sétimo ano consecutivo.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

A Noite

Não sei dizer, nem se quero dizer - mesmo que pudesse - aquilo que tinha para dizer há pouco. Parece que tudo ficou branco, a ideia simplesmente fugiu. Tendo em mente alguma referência, de certa forma, é possível traçar ao menos o contorno daquilo que se pretende comunicar, mas, infelizmente, tal feito tornar-se-á impossível, devido à memória e sua súbita traição.

Lembro-me de uma centelha, algo sobre a noite. Que triste investigação, justo a noite, lugar por demais extenso. A noite, espaço escuro, dentre acaso e alvorecer. Há tanto para dizer que, qualquer averiguação pode parecer mera tentativa ou pretexto, para fugir do assunto em questão: a ideia que correu da mente e perdeu-se em algum lugar do tempo, momento passante, lapso formoso do esquecimento; blackout.

Esta, por assim dizer, há de ser – e por que não – uma noite intranquila. Não obstante, diante de um genuíno pesadelo para quem pensa, desisti de abrir mão, pura e simplesmente, da ideia de jamais reencontrar aquela outra que tive quase agora. Soa-me fraco e preguiçoso em demasia, dar de costas às capacidades neurológicas.

Algo sobre a noite e sua classificação morfossintática, talvez. Substantivo feminino singular; percebam, feminino e singular, como não poderia ser diferente. No fim das contas, por mais que force o contrário, percebo estar novamente referindo-me à peculiaridade amulherada.  

Ou seja, quaisquer que sejam os ensaios, pelo visto, tudo se resume ao mesmo de sempre; ela, ela e ela - nesse caso, especificamente e devido à amnésia - a noite.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Que Gostoso, O Amor!

Ele parte sem rumo, a noite é uma criança, a noite é uma delícia.

Ela parte sem rumo, a noite é uma eterna dança, a noite é de fato, um espetáculo.

Eles se encontram...

E de mãos dadas, caminham pelas ruas da cidade. Fazem parte de um contexto mas não se encaixam nos clichês habituais. Parecem distantes, paralelos, como se estivessem ali, mas numa outra dimensão. Dentro de uma bolha, dentro de um armário qualquer, sob um jogo de lençóis antigos ou até mesmo apenas caminhando pelas ruas da cidade.

Os olhos dizem mais que as bocas. Olhares de amor, troca frequente. O amor é um evento maravilhoso. Os olhos dos que amam olham de uma maneira única, é diferente, há um brilho inexplicável, uma cumplicidade que – com o perdão trocadilho – realmente salta aos olhos. É bonito de ver, é bonito observar, esses dois babacas caminhando juntos pela noite, trocando beijos sem prestar muita atenção no restante desse universo imenso.

De mãos dadas pelas ruas da cidade, eles beijam sem pudor e nem dão conta do tempo. O relógio parece não gostar muito do que vê.

Incrível como as horas voam. O amor é um evento grandioso. Não dá pra saber ao certo quanto tempo cabe em um punhado de minutos. Talvez horas e mais horas de carinho ininterrupto. Alguém se arrisca a dizer que estão errados¿ Não, não. Podem se beijar à vontade! A noite, essa bela criança brincalhona, essa delícia danada, essa dança circular-extasiante, esse espetáculo todo - pra não dizer mais nada – é de vocês!


Minha menina cocaína

Pior que coca-cola ou
Balinha de goma que gruda no dente;
ou candy crush, simplesmente

Prazer eloquente, como pastilha
Efervecente

Vício feliz, vivo sorridente;

E não tenho azias há mais de 
dois meses.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Como Cair de Bicicleta

Quando eu era apenas um menino, gostava de andar descalço e morria de medo de bicicletas. Sempre tive a convicção de que cairia na primeira tentativa. Estava certo, não caí, somente. Estatelei-me pelo chão de terra e guardei - para sempre na pele - a lembrança daquele feito incrivelmente frustrante.

Não me recordo da primeira vez em que finalmente consegui trilhar uma linha reta sem maiores acidentes. Sei apenas que tal persistência surtiu longo e permanente efeito. Hoje em dia, sempre que posso, sigo a caminhar descalço, mas não em falso, e ainda arrisco algumas pedaladas pelas ruas da cidade histórica, mesmo sabendo do perigo das pedras mal encaixadas.

Agora, a exatidão em relação às primeiras linhas escritas é parte de um passado distante. Não posso dizer quando foi que comecei a poetizar o dia a dia. Talvez por necessidade, afinal, minha timidez é intrínseca - como que só pudesse fazê-lo por outra via que não a oral - escrevi um bilhete para uma menina que jamais o respondeu. Experiência muito menos traumatizante que os tombos da velha magrela, enfim, plenamente compreensível e contornável.

Dali em diante, um restante de histórias e mais histórias pra contar. Um bom punhado de sentimentos descritos em versos e parágrafos intermináveis. Da menina linda dos olhos azuis à menina linda dos cabelos castanhos. Das tantas andanças e mudanças, imprescindíveis. Dos amores passados, aos amores presentes.

A vida é feita de encontros, desencontros e reencontros, disse-me certa vez, aquela que invade meus envelopes. Um longo percurso, inacreditavelmente surpreendente e repleto de tudo um pouco; provavelmente impossível para a capacidade motora de um menino em seu veículo de duas rodas, mas absolutamente factível para a eternidade de suas folhas em branco.