quinta-feira, 14 de outubro de 2010

23 Anos

23 Anos

Eu tenho vinte e três anos.

Quando eu nasci, o Brasil era um país muito diferente do que ele é hoje. Não existia internet, celular, aparelho de DVD, nada dessas coisas que rolam por aí. Um computador era artigo de luxo, um telefone móvel, algo muito além da compreensão. Todas as fitas tinham de ser completamente rebobinadas e devolvidas no balcão.

Vinte e três anos e nove meses. Vinte três anos e uma gestação.

São duzentos e oitenta e cinco meses. Duzentas e oitenta e cinco páginas viradas de vinte e três calendários diferentes.

É praticamente impossível calcular quantos dias eu tenho de vida. Quantas vezes eu dormi, quantas vezes eu fingi e quantas vezes eu só cochilei. Também não sei quantas vezes me perdi, quantas vezes eu tentei e quantas vezes acordei. Horário sempre foi um grande problema na minha vida.

Vinte e três anos, uma gestação e mais uns quinze dias.

É possível mudar de vida em quinze dias. É possível se apaixonar em quinze dias. É possível se comprometer infinitas vezes e não cumprir com nada. É possível viajar, ir e voltar, conhecer coisas novas. Geralmente é esse o tempo médio de duração de uma viagem. Quinze dias. Dá até pra aprender inglês durante esse tempo. Tem um monte de cursos por aí afirmando isso. São duas semanas mais um dia. Você pode muito bem ficar sem fazer nada também, e só render no último dia, contanto que renda e muito. É isso que o mundo espera de você.

Não tenho idéia de quantas horas já se passaram.

Um minuto que passa, passa. Vira memória. Imagina só quantos minutos não se passaram desde que eu sentei na frente do antigo artigo de luxo pra escrever essas palavras. Muitos. Ou então, nos milhares, milhões, bilhões ou trilhões de segundos que me trouxeram até aqui.

Um minuto. Vivo escutando isso. Um minuto pra quem opera uma central de telemarketing é tempo suficiente pra resolver um problema, talvez contar uma piada, curtir com a minha cara, vai saber. Para outros, um minuto é um minuto. Sessenta segundos, que passam rápido demais e por conta disso, nem são levados em conta.

Para quem sofre de ejaculação precoce, em um minuto, dá até pra dar uma bela duma gozada.

Hoje, eu vivo num país muito mudado, que não tem inflação, mas que vive de mensalão e corrupção. Opa! Pouco mudou então. Tão logo eu nasci, o então presidente haveria de ser impugnado - algo que antes se chamava impeachment - e de política mesmo só fui ficar sabendo depois de uns quinze anos.

Não que eu goste, ou desgoste. A política é obrigatória. Quem diz que não gosta de política ou que não acompanha, mente. Ou vai querer me dizer que na hora de pagar as contas ou comprar um carro novo você não opta? Cada escolha é uma renúncia, não? O homem é um animal político. Já dizia Aristóteles.

O tempo passa e eu aqui de graça falando um monte.

Há exatos onze minutos eu bati a primeira tecla. Onze minutos é o tempo que eu levo pra ir da minha casa até o metrô. Do metrô, em onze minutos, eu percorro seis ou sete estações, atravesso a cidade. Deve ter muita gente indo de um lado pro outro enquanto eu escrevo isso aqui.

Eu tenho vinte e três anos.

E não fiz nada pra mudar o mundo.

Eu já desperdicei horas, não tentando mudar o mundo, mas tentando mudar a maneira com que as pessoas compreendem o mundo. Já cansei de falar, argumentar. Cuspir e levar cuspida.

O mundo não é mais o mesmo.

Não é mais o mesmo mundo que era há vinte e três anos, nove meses e quinze dias atrás.

Nem será daqui a vinte e três anos, nove meses e quinze dias.

O quê irá mudar? Espero que muita coisa.

Os carros terão asas e a nossa casa será controlada pelo poder da mente. Todas as crianças serão inteligentes, não existirão mais partidos políticos e sim frentes de mudança extremamente vinculadas aos seus propósitos, o verde estará nas ruas e nas cabeças das pessoas, assim como a emissão de poluentes estará totalmente controlada.

Sonhos.

A verdade é cruel e tem de ser dita. Seguindo a linha Marina Silva de raciocínio, nada será feito, e a humanidade sucumbirá, graças ao seu próprio desejo de prosperidade.

O fim está próximo.

Quando eu nasci nada disso se discutia. Eram idéias tolas dos primeiros ambientalistas preocupados que surgiram na Terra. Era balela. Besteira. Pouca bosta. Hoje é tema central de campanhas políticas e independentes por todo os cantos do planeta. Deu pouca atenção pra samambaia? Pro pardal? Nem ligou quando seu peixinho morreu? Então cara! Você é um alienado! Você é um corrompido! Você tá por fora da realidade!

Você não faz parte desse mundo ou faz parte da massa!

E a massa caga.

A massa caga no pau.

A massa corrompe.

A massa manda no pedaço.

A massificação de idéias estapafúrdias e sua disseminação sem qualquer critério, uma vez, nos levou a eleição de um presidente oriundo dessa mesma massa.

A unanimidade é escrota, burra! A ignorância reina onde não existe oposição.

Trinta e quatro minutos.

Trinta e quatro minutos de texto.

Que se eu multiplicar por três dá mais ou menos uma hora e quarenta. Uma hora e quarenta, quase um filme. Um Tropa de Elite II, por quê não? Queria eu ter escrito o roteiro desse filme, salve José Padilha, o cara que resolveu abrir a boca da maneira mais inteligente de todas. Sim. Não fez carreata, não matou ninguém, não participou de debate e pôs à mostra todo o esquema de corrupção das milícias do Rio de Janeiro.

É longe daqui.

O Rio é longe daqui.

Mas a putaria tá em todos os lugares, nas filas dos bancos, nos corredores das escolas, nas bocas das pessoas desonestas e nos bolsos dos mais miseráveis.

Há quatro anos atrás eu tinha dezenove. Era um idiota que não pensava em porra nenhuma além de escrever. Hoje eu sou um idiota que pensa numa caralhada de coisas ao mesmo tempo e que continua só pensando em escrever.

Quatro anos.

Pra quem tem oito é a metade.

Pra quem tem dois, é o dobro.

Pra mim que tenho meus vinte e três, é um bocado de tempo. Tempo pra fazer um bocado de coisas. Coisas que acarretariam num bocado de melhorias. Melhorias que fariam uma baita diferença para as pessoas à margem.

Quatro anos.

Dá ou não dá tempo pra mudar muita coisa?

Se em quarenta minutos eu escrevi isso aqui, e mudei o texto um monte de vezes, será que não dá pra mudar ou pelo menos tentar?

O babaca não é aquele que tenta e erra. E sim o que não tenta por medo de tomar no briôco.  

Errar é humano. Errar duas vezes é foda.

Agora, errar diversas vezes... é estrela vermelha.

Na certa.