quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Crime, Castigo, Paz & Recompensa

Ele não leu o Dostoiévski que ela comprou. Pior! Nem ao menos imaginou que aquele pacote lacrado em cima de seu criado mudo poderia ser um Dostoiévski! Porra! Um Dostoiévski! O Dostoiévski que ela comprou no dia do seu aniversário! Ela lembrou a data, saiu, arrematou um baita livro e ele não deu a mínima...

Ela:

Puta que pariu, sabe!? Vai pra casa do caralho! Você não leu o Dostoiévski! Você não leu a porra do Dostoiévski que eu te comprei e ainda quer que eu leve a sério esse relacionamento?

Ele:

Amor! Desculpa! Eu não li o Dostoievsky! É que, quando eu vi aquele Graciliano Ramos por míseros dois reais, eu soube na hora... era a glória, era um ato obrigatório! Amor! Um Graciliano Ramos por dois reais! Eu sou um predestinado, isso é inacreditavelmente inacreditável, absurdo, fantástico!

Ela:

Pau no cu do gato! Eu não quero saber se você tá encantado! Você não leu o Dostoievsky que eu te comprei em troca desse livrinho barato! Infeliz! Bastardo! Bastava ter aberto o pacote!? Não era O Capote (Gogol) mas era um agrado! Não! Você tinha que causar esse estardalhaço! Palhaço! Vontade de cuspir na sua cara! Cretino! Mal agradecido do caralho! Pega esse Graciliano e enfia no rabo!

Terminaram a noite se amando loucamente em baixo dos lençóis. Ele foi pego de surpresa. Inesperadamente, ficou sem reação, por se tratar de uma abordagem no mínimo áspera, dentro de um relacionamento até então estável. Antes de tirar a roupa, ela o fez ler o prefácio. Algumas poucas palavras, antes de um verdadeiro mergulho existencial em suas intimidades, agora, um tanto menos agitadas. Enfim, um feliz aniversário.